quinta-feira, 31 de março de 2011

Os exemplos opostos de José Alencar e Jair Bolsonaro

Os exemplos opostos de José Alencar e Jair Bolsonaro Luciano Rezende * O coração de José Alencar parou de bater. Mas o forte sentimento de amor à vida e ao país que ele despertou nos brasileiros continua a pulsar. Na contramão do exemplo de Alencar, o deputado Jair Bolsonaro (PP/RJ) segue a verter sangue pela boca disseminando seu ódio contra milhões de brasileiros. São exemplos distintos da política nacional. Enquanto Alencar ajudou a engrandecê-la, Bolsonaro persiste em aviltá-la. A morte de Alencar, ainda que estivéssemos minimamente preparados para ela, repercute emotivamente em toda a imprensa. Emoção inversa foram as declarações racistas e homofóbicas proferidas pelo deputado Bolsonaro contra a cantora Preta Gil, em programa de televisão na noite desta segunda-feira (28), que também ganharam manchetes nos jornais.Não interessa se Bolsonaro entendeu bem a pergunta ou confundiu “negro” com “gay”. Basta ver o histórico de intolerância do parlamentar para constatar que o mesmo é um reincidente contumaz nestes pronunciamentos odientos. É o exemplo de amor a uma ou mais causas demonstrado por Zé Alencar que falta a muitos na política nacional. O ódio que Bolsonaro nutre por diversos segmentos de nossa sociedade segue o caminho inverso. José Alencar permanece como um símbolo de tolerância e respeito às distintas opiniões e ideias. Mostrou a muitos militantes de esquerda, por exemplo, que não deveria ser ele, enquanto burguês, o alvo das críticas, senão uma classe social burguesa rentista e parasitária que espolia a pátria. Já Bolsonaro representa a intransigência. Instiga grupos reacionários e extremistas de direita que não é ele, um representante da moral e dos bons costumes a exceção, mas o que ele insulta como sendo a ralé da sociedade composta por prostitutas, veados, maconheiros, terroristas (comunistas) e outros termos pejorativos que o mesmo faz questão de pronunciar de forma veemente através da grande mídia.Imagine se Bolsonaro fosse um parlamentar que apoiasse o governo Dilma. Teria o mesmo tratamento beneplácito dispensado pela mídia que o trata como folclore ou homem-bomba de seus pensamentos mais íntimos e impronunciáveis publicamente? Uma das melhores formas de render homenagens à figura humana democrática e pacificadora que representa José Alencar, além de baixar as taxas de juros, é condenar Bolsonaro por suas recorrentes declarações preconceituosas que também enlutam a nação.Nesse sentido, a ação enérgica da presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a deputada Manuela D`Ávila (PCdoB/RS), que anunciou providências contra os impropérios de Bolsonaro, deve ser saudada. Importante lembrar que Alencar transitava em todos os partidos políticos e frequentemente exaltava os comunistas. O PCdoB em geral e a figura de Jô Moraes em Minas era carinhosamente enaltecida pelo estadista que sabia reconhecer os aliados. Bolsonaro trata a mais antiga agremiação política como uma organização terrorista e venera os torturadores da ditadura militar e os assassinos do Araguaia.Além do mais, o energúmeno cultiva a polêmica rasteira para agradar seu eleitorado fascistóide. Mas homofobia, assim como o racismo, é crime e extrapola as supostas divergências da esfera moral, religiosa ou ideológica. Em meio à comoção da morte de Zé Alencar, que muito nos ensinou sobre tolerância e capacidade de aglutinar diversos setores da sociedade em torno de objetivos maiores repugna a conduta de Jair Bolsonaro, o deputado troglodita.O exemplo de José Alencar vive. Já o de Bolsonaro merece ser sepultado, incabível em um país como o nosso, em pleno século XXI. * Engenheiro agrônomo, mestre em Entomologia e doutorando em Genética. Professor do Instituto Federal do Alagoas.

Os exemplos opostos de José Alencar e Jair Bolsonaro

Os exemplos opostos de José Alencar e Jair Bolsonaro Luciano Rezende * O coração de José Alencar parou de bater. Mas o forte sentimento de amor à vida e ao país que ele despertou nos brasileiros continua a pulsar. Na contramão do exemplo de Alencar, o deputado Jair Bolsonaro (PP/RJ) segue a verter sangue pela boca disseminando seu ódio contra milhões de brasileiros. São exemplos distintos da política nacional. Enquanto Alencar ajudou a engrandecê-la, Bolsonaro persiste em aviltá-la. A morte de Alencar, ainda que estivéssemos minimamente preparados para ela, repercute emotivamente em toda a imprensa. Emoção inversa foram as declarações racistas e homofóbicas proferidas pelo deputado Bolsonaro contra a cantora Preta Gil, em programa de televisão na noite desta segunda-feira (28), que também ganharam manchetes nos jornais.Não interessa se Bolsonaro entendeu bem a pergunta ou confundiu “negro” com “gay”. Basta ver o histórico de intolerância do parlamentar para constatar que o mesmo é um reincidente contumaz nestes pronunciamentos odientos. É o exemplo de amor a uma ou mais causas demonstrado por Zé Alencar que falta a muitos na política nacional. O ódio que Bolsonaro nutre por diversos segmentos de nossa sociedade segue o caminho inverso. José Alencar permanece como um símbolo de tolerância e respeito às distintas opiniões e ideias. Mostrou a muitos militantes de esquerda, por exemplo, que não deveria ser ele, enquanto burguês, o alvo das críticas, senão uma classe social burguesa rentista e parasitária que espolia a pátria. Já Bolsonaro representa a intransigência. Instiga grupos reacionários e extremistas de direita que não é ele, um representante da moral e dos bons costumes a exceção, mas o que ele insulta como sendo a ralé da sociedade composta por prostitutas, veados, maconheiros, terroristas (comunistas) e outros termos pejorativos que o mesmo faz questão de pronunciar de forma veemente através da grande mídia.Imagine se Bolsonaro fosse um parlamentar que apoiasse o governo Dilma. Teria o mesmo tratamento beneplácito dispensado pela mídia que o trata como folclore ou homem-bomba de seus pensamentos mais íntimos e impronunciáveis publicamente? Uma das melhores formas de render homenagens à figura humana democrática e pacificadora que representa José Alencar, além de baixar as taxas de juros, é condenar Bolsonaro por suas recorrentes declarações preconceituosas que também enlutam a nação.Nesse sentido, a ação enérgica da presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a deputada Manuela D`Ávila (PCdoB/RS), que anunciou providências contra os impropérios de Bolsonaro, deve ser saudada. Importante lembrar que Alencar transitava em todos os partidos políticos e frequentemente exaltava os comunistas. O PCdoB em geral e a figura de Jô Moraes em Minas era carinhosamente enaltecida pelo estadista que sabia reconhecer os aliados. Bolsonaro trata a mais antiga agremiação política como uma organização terrorista e venera os torturadores da ditadura militar e os assassinos do Araguaia. Além do mais, o energúmeno cultiva a polêmica rasteira para agradar seu eleitorado fascistóide. Mas homofobia, assim como o racismo, é crime e extrapola as supostas divergências da esfera moral, religiosa ou ideológica. Em meio à comoção da morte de Zé Alencar, que muito nos ensinou sobre tolerância e capacidade de aglutinar diversos setores da sociedade em torno de objetivos maiores repugna a conduta de Jair Bolsonaro, o deputado troglodita.O exemplo de José Alencar vive. Já o de Bolsonaro merece ser sepultado, incabível em um país como o nosso, em pleno século XXI. * Engenheiro agrônomo, mestre em Entomologia e doutorando em Genética. Professor do Instituto Federal do Alagoas.

terça-feira, 22 de março de 2011

Para além da austeridade

Para além da austeridade
Resumo do artigo de William Mitchell* - The Nation

A crise econômica global pode levar a crer que a promessa neoliberal – de que os mercados podem se autorregular e promover prosperidade sustentável para todos – era uma mentira. Mas isso não parece ter sido percebido pelos governos, os quais, sem exceção, construíram suas respostas para a crise numa série de mitos – os mesmos mitos que a causaram. ....
. Mesmo que milhões permaneçam sem emprego e que os índices de pobreza estejam subindo, os governos têm dito que não há alternativa à austeridade, cortando os déficits orçamentários. ....

... a dominação inquestionável da ideologia neoliberal reduziu o debate econômico a questões de nuances. Os conservadores recusam o aumento de impostos e querem mais cortes nos gastos, enquanto os progressistas defendem a combinação entre cortes de gastos e aumento de impostos. Essa homogeinização do debate político não somente asfixiou as vozes progressistas; ela também obscureceu a única via confiável de recuperação econômica.

Os déficits públicos não causam inflação, nem impõem dívidas pesadas paralisantes sobre nossas crianças e nossos netos. ...
A maior de todas as mentiras – repetida um sem número de vezes pelos economistas neoliberais e ecoadas acriticamente pela mídia dominante – é a afirmação de que se os governos cortam seus gastos, o setor privado vai se arranjar para tapar o buraco. A campanha pela austeridade do primeiro ministro britânico, David Cameron e o anúncio dos cortes orçamentários do presidente Obama estão erguidos nessas mentiras. ....

.. a linguagem da austeridade arraigou-se no debate público ao longo de décadas de má-educação e grosserias via Fox News e coisas do tipo. Essas redes de tevê promovem políticos conservadores e agridem os que desafiam seus pontos de vista. Quem quer que ouse advogar o aumento dos déficits é excomungado como sendo incompetente ou um socialista perigoso. No entanto, o fato de tanto se berrar que os déficits públicos são ruins não os torna ruins. ...

Mas o governo não é uma casa. Ele pode gastar consistentemente mais do que recebe porque é quem cria a moeda. Enquanto as casas têm de poupar (gastar menos do que se recebe) para gastar mais no futuro, os governos podem adquirir o que quiserem, quando houver bens e serviços para vender na moeda que emitem. Superávits orçamentários não fornecem maior capacidade aos governos de atenderem às necessidades futuras, nem déficits orçamentários erosionam essa capacidade. Os governos sempre tem capacidade de gastar em suas próprias moedas.

A continuidade do domínio conservador
Os economistas neoliberais e seus apoiadores fracassaram em prever a crise recente e não apresentaram solução efetiva quando ela eclodiu. Organizações como o FMI e a OECD defenderam políticas que contribuíram com a crise. Então, por que os mitos neoliberais ainda dominam? E como pôde o governo britânico ser capaz de impor austeridade, quando os indicadores são de que isso causará danos severos à economia? ...
O problema repousa nos governos – no seu fracasso em regular adequadamente e em usar sua capacidade fiscal de assegurar que há empregos suficientes.

A mais recente crença religiosa na autorregulação dos mercados promoveu políticas que permitiram que a lógica inerente do capitalismo explodisse. Os governos abandonaram seu papel estabilizador como intermediários entre o trabalho e o capital. Em vez disso, cativos do setor financeiro, apoiaram perigosas e em alguns momentos desonestas práticas bancárias. O dinheiro comprou o acesso à mídia nacional, enquanto as vozes progressistas lutavam para ser escutadas. Esse é o poder desses lobbys e porta-vozes, de modo que mesmo sendo sua abordagem completamente desacreditada desde a crise, os neoliberais permanecem no controle da agenda política e tornaram o que era claramente uma crise de dívida privada numa suposta crise de dívida soberana.

O que deve ser feito?
A austeridade não é a única alternativa. As grandes economias estão sofrendo com um colapso do gasto privado e um excedente de dívida privada. Os consumidores não gastarão se tiverem medo de desemprego; as empresas não contratarão e nem venderão se as vendas estacionarem. Desemprego persistente significa que nossas economias renunciaram a produzir massivamente e às oportunidades de renda. O desemprego também causa outros problemas, como as destruições das famílias, o aumento do consumo de álcool e do abuso de drogas, o aumento nos índices de criminalidade e das migrações. Uma economia com alto nível de desemprego não é saudável.

A austeridade agravará o desemprego. Isso leva ao apelo pela crença de que um governo confiante no progresso do bem estar de seus cidadãos irá deliberadamente introduzir políticas que farão com que seu povo não tenha problema de emprego.Ao defender estímulos fiscais futuros, eu voltaria o aumento do gasto público diretamente para o foco na criação de empregos. Introduziria um programa de emprego público por um período indefinido – uma política de emprego garantido – que ofereça um emprego de salário (mínimo) para quem quiser trabalhar mas não encontra emprego.
O programa de garantia de empregos faria com que os trabalhadores aproveitassem a estabilidade de renda, e seu gasto crescente iria impulsionar a confiança na economia e ajudar na recuperação do gasto privado. Não há razão para que os governos não possam arcar com esse programa. O mercado de trabalho está disponível para o trabalho, e o governo pode facilmente fornecer os empregos. Não houve questionamento quando o governo, nos primeiros dias da crise, providenciou instantaneamente bilhões para os bancos. Deixem-me repetir: o governo não tem restrição financeira no seu gasto e deveria alocar imediatamente recursos para um programa de criação massiva de empregos.

(*) William Mitchell é professor pesquisador de economia no Centro Para o Pleno Emprego e a Equidade da Universidade de New Castle, Austrália. Entre outras atividades, acadêmicas e não acadêmicas, mantém um blog de Pensamento Econômico Alternativo.Tradução: Katarina Peixoto

sexta-feira, 18 de março de 2011

Obama : reina mas não governa

"Obama foi anulado pelo conservadorismo de bordel dos EUA"
Em entrevista exclusiva à Carta Maior, a economista Maria da Conceição Tavares fala sobre a visita de Obama ao Brasil, a situação dos Estados Unidos e da economia mundial. Para ela, a convalescença internacional será longa e dolorosa. A razão principal é o congelamento do impasse econômico norte-americano, cujo pós-crise continua tutelado pelos interesses prevalecentes da alta finança em intercurso funcional com o moralismo republicano. ‘É um conservadorismo de bordel’, diz. E acrescenta: "a sociedade norte-americana encontra-se congelada pelo bloco conservador, por cima e por baixo. Os republicanos mandam no Congresso; os bancos tem hegemonia econômica; a tecnocracia do Estado está acuada”.

Redação
Carta Maior - Quinta-Feira, 17 de Março de 2011




Alguns trechos da entrevista...



Os EUA se tornaram um país politicamente complicado... o caso americano é pior que o nosso. Não adianta boas idéias. Obama até que as têm, algumas. Mas não tem o principal: não tem poder, o poder real; não tem bases sociais compatíveis com as suas idéias. A estrutura da sociedade americana hoje é muito, muito conservadora –a mais conservadora da sua história. E depois, Obama, convenhamos, não chega a ser um iluminado. Mas nem o Lula daria certo lá.”



O "poder" de Obama : "reina mas não governa"

“Obama foi eleito pela juventude e pelos negros. Na urna, cada cidadão é um voto. Mas a juventude e os negros não tem presença institucional, veja bem, institucional que digo é no desenho democrático de lá. Eles não tem assento em postos chaves onde se decide o poder americano. Na hora do vamos ver, a base de Obama não está localizada em lugar nenhum. Não está no Congresso, não tem o comando das finanças, enfim, grita, mas não decide.” ...

"Quase nada depende da vontade de Obama, ou dito melhor, a vontade de Obama quase não pesa nas questões cruciais."



Sobre a crise

“Os EUA por sua vez, ao contrário do que ocorreu na Segunda Guerra, quando eram os credores do mundo, hoje estão pendurados em papagaios com o resto do mundo –o Japão inclusive. O que eles poderiam fazer pela reconstrução se devem ao país devastado?” ....

“É um avatar de moeda sem nenhum controle. Derivam de coisa nenhuma; derivativos de coisa nenhuma representam a morte da economia; uma nuvem nuclear de dinheiro contaminado e fora de controle da sociedade provoca tragédia onde toca. Isso descarnou Obama. É um conservadorismo de bordel, que não conserva coisa nenhuma. É isso a aliança entre o moralismo republicano e a farra da finança especulativa. Os EUA se tornaram um gigante de barro podre. De pé causam desastres; se tombar faz mais estrago ainda. Então a convalescença será longa, longa e longa.”

sexta-feira, 11 de março de 2011

Os “amigos” dos EUA no Brasil

WikiLeaks: os “amigos” dos EUA no Brasil
Os novos documentos do serviço diplomático dos EUA vazados pelo WikiLeaks ainda vão dar muito o que falar. Traduzidos, eles serão um prato cheio para a crítica demolidora da blogosfera progressista – já que a mídia colonizada evita repercuti-los – e servirão também de fonte para futuros estudos acadêmicos sobre as complexas relações Brasil-EUA.
Por Altamiro Borges

Entre outras questões, os documentos vazados servem para quatro reflexões iniciais:

1- Como já afirmou Julian Assange, o criador do WikiLeaks que é vítima de brutal perseguição do império, eles comprovam que o serviço diplomático dos EUA virou, na prática, um centro de espionagem. Embaixadores, cônsules e outros serviçais até parecem agentes da CIA. Eles bisbilhotam a vida das pessoas (inclusive do secretário-geral da ONU, investigado por ordens diretas de Hillary Clinton), coletam dados para favorecer a “guerra comercial” das multinacionais ianques e tentam interferir nos rumos de países “soberanos”. Em outro contexto histórico, os diplomatas dos EUA simplesmente seriam expulsos dos países espionados.

2- Apesar de decadente e em crise, o imperialismo estadunidense continua bastante ativo e agressivo – o que deveria servir de alerta para alguns que acreditavam que ele já nem mais existia. A diplomacia dos EUA, como não poderia deixar de ser, visa unicamente manter os interesses econômicos e políticos do império. Ela monitora tudo o que ocorre no mundo, em especial nos países mais estratégicos na geopolítica mundial. Neste sentido, o Brasil é alvo de permanente espionagem. Como sempre enfatiza Samuel Pinheiro Guimarães, ex-secretário-geral do Itamaraty, o nosso país desperta forte cobiça por sua dimensão continental, densidade populacional, capacidade produtiva e reservas naturais. Não se deve subestimar seu potencial – e os EUA sabem disto.

3- Os memorandos vazados pelo WikiLeaks também confirmam que os EUA mantêm intimas ligações com a direita entreguista do Brasil – o que já é fartamente conhecido na história. Apesar de o governo Lula ter mantido “relações cordiais” com o império, este nunca tolerou a sua política externa mais altiva – como na prioridade ao Mercosul ou na rejeição ao golpe militar-ianque em Honduras. Não é para menos que a diplomacia estadunidense sempre privilegia o contato com a oposição demotucana, conforme relata Natalia Vianna, representante do WikiLeaks no Brasil (leia aqui). Nas eleições de 2010, ela voltou a manifestar simpatia por José Serra, o candidato demotucano que prometeu que “como presidente iria pressionar por uma política externa mais alinhada com os EUA”, segundo um dos telegramas enviados pelo consulado de São Paulo à Casa Branca.

4- Mas os EUA não têm “amigos” apenas nos partidos de direita com complexo de vira-lata. O risível nos últimos documentos do WikiLeaks é que eles confirmam a relação promíscua de setores da mídia “privada” com o império. Num dos memorados há o relato da reunião, em 12 de janeiro último, do cônsul dos EUA com um “importante colunista da revista Veja, Diogo Mainardi”. Ele explica como, a partir de uma “conversa com José Serra”, escreveu sua coluna propondo o nome de Marina Silva como vice na chapa da oposição – para “contrabalançar a atração pessoal que Lula exerce sobre os pobres”. Outro descreve a conversa do cônsul, em 21 de janeiro, com Merval Pereira, colunista do jornal O Globo, que aposta que o ex-governador mineiro aceitará ser vice do ex-governador paulista e que “uma chapa Serra-Neves” seria imbatível. Após a leitura dos documentos fica a dúvida se estes e outros “calunistas” da mídia são cabos-eleitorais da direita, que escrevem sob o seu soldo, ou meros “amigos” dos EUA.

sábado, 5 de março de 2011

O lulismo de Dilma

Bolsa-Família pra cá, juros pra lá: o lulismo de Dilma
publicada quarta-feira, 02/03/2011 às 13:37 e atualizada quinta-feira, 03/03/2011 às 00:37
por Rodrigo Vianna


O COPOM (órgão que define as taxas de juros no Brasil – ou seja, define a quantidade de sangue que o coração financeiro pode bombear para as artérias da economia real) decidiu, pela segunda vez no governo Dilma, elevar os juros.
Anteontem, na Bahia, Dilma aumentou o Bolsa-Família bem acima da inflação.
Os dois movimentos são aparentemente contraditórios. Essa “contradição” (fora do manual clássico dos liberais que dominaram o governo FHC, e ainda dominam os velhos jornais brasileiros) foi a base do sucesso de Lula.
Façamos uma parada rápida. E vejamos o texto curto que o site “Carta Maior” destaca em sua capa:
Dilma corrige os valores do Bolsa Família e dá reajuste real ao benefício recebido por 12,9 milhões de famílias. O menor valor da transferencia de renda passa de R$ 22 para R$ 32; o maior, de R$ 200 para R$ 242. Famílias com filhos foram contempladas com as maiores taxas de aumento real. A reunião do Copom desta 4º feira servirá um ‘lexotan’ aos mercados. Se subir 0,5% a taxa de juro básica, a Selic, oferecerá aos rentistas um ‘tranquilizante’ da ordem de R$ 7,5 bilhões/ano; quase quatro vezes o gasto previsto com o reajuste do Bolsa Família que vai beneficiar 50 milhões de brasileiros pobres. Aguardemos a avaliação da mídia para cada um desses dispêndios fiscais.

A avaliação da mídia já veio. “Dilma corta de um lado e gasta de outro”, dizem os jornais.
Ok, é um fato. Os jornais só não dizem que subir juros (pra conter inflação? Mas a inflação não vem em boa parte do aumento do preço de alimentos, que é mundial?) também é gasto – na medida em que faz aumentar a já trilionária dívida pública! Mas essa é uma discussão à parte…

Observemos com calma outro ponto: o governo Lula conseguiu apoio dos muitos pobres e dos muito ricos. Fez isso com mecanismos como o “Bolsa-Família” – que retirou milhões de brasileiros da indigência, e ao mesmo tempo ajudou a girar a economia das regiões mais pobres do país. Ao contrário do que diz o deputado Vacarezza (ele é do PT mesmo?), a grana do Bolsa-Família não vai pra “cachaça”; vai pra comida, roupa… Quem visitou o Nordeste nos ultmos anos (e eu tive a felicidade de ir cinco vezes para o sertão nos últimos quatro anos) percebe como o comércio local cresceu, gerando uma nova classe média nordestina. Fora isso, houve a recuperação do salário-mínimo e a reversão da tendência (que vinha da era FHC) de sufocar o funcionalismo público (com ganhos salariais e novos concursos na era Lula).

Mas Lula também agradou os muitos ricos. Donos de fábricas e grandes comerciantes nunca faturaram tanto – graças ao mercado interno impulsionado pela redução da pobreza. E os rentistas (a minoria ínfima que aplica dinheiro, pra financiar a dívida do governo) seguiram ganhando com os juros mais altos do Planeta.

Quem ficou contra Lula? A velha clase média. Arrochada por impostos, e sem utilizar serviços públicos, essa classe média pensa com o bolso na maior parte. Sente-se prejudicada por esse arranjo de Bolsa-Família (“é esmola”, como dizem) + impostos altos + Estado forte.
Nas semanas anteriores, Dilma tomou medidas variadas na área econômica, sempre no sentido de frear a tendência expansionista do segundo mandato de Lula:
- congelou concursos públicos (desagradando a tradicional base sindical lulista entre o funcionalismo);
- deu aumento de salário mínimo abaixo do reivindicado pelas centrais sindicais (mas dentro da regra estabelecida na era Lula);
- subiu juros;
- cortou 50 bilhões de reais do Orçamento.

Os liberais aplaudiram. A esquerda e os sindicalistas ficaram ressabiados.
Agora, as medidas dessa semana mostram que Dilma segue a mesma fórmula de Lula: um agrado ao “mercado”, aos rentistas e à velha mídia (com juros altos e cortes de gastos públicos), mas sem descuidar da base popular (com aumento acima da inflação para o Bolsa-Família).
Dilma, ao que tudo indica, seguirá se equilibrando entre os dois extremos da pirâmide social (como fez Lula).

Com uma novidade: o movimento de aproximação com a velha mídia é uma tentativa de ganhar a simpatia da velha classe média, que votou em Marina e Serra (e que lê “Veja”, “O Globo”, “Folha”, “Estadão”…)

Quem está de fora desse arranjo por enquanto? Os setores organizados (sindicatos, trabalhadores do mercado formal), a esquerda tradicional, os movimentos sociais.
O cálculo de Dilma, parece-me, é de que esses setores no limite estarão com ela se a coisa apertar. Pode ser arriscado… O presidente da Força Sindical, Paulinho (PDT), já mandou petardos contra o governo. E em recente reunião da “Coordenação de Movimentos Sociais”, o presidente da CUT (central organicamente próxima do governo) deu o recado: “este namoro da Dilma com a mídia vai durar seis meses e aí depois o governo virá nos procurar para sustentá-lo, como fez em 2005”.
Há decepção geral, entre setores que apoiaram Dilma de forma decidida (e decisiva) quando a situação apertou entre o fim do primeiro turno e o início do segundo. Esses setores sentem-se abandonados pelos primeiros movimentos de Dilma.

Isso, talvez, não se reflita nas primeiras pesquisas de opinião após os cem dias inicias de governo. Resta saber se, quando a lua-de-mel com a velha mídia acabar e Dilma sofrer ataques violentos como os sofridos por Lula, ela poderá contar com essa base tradicionals do lulismo? Ainda é cedo pra saber. O certo é que rachaduras se abriram nesses dois primeiros meses.