Transferências Tributárias e a nova Lei Robin
Hood
Daniel Miranda Soares
(*)
http://www.diariodoaco.com.br/noticias.aspx?cd=65808
Publicado originalmente no Diário do Aço em 15/08/2012
A carga tributária brasileira é altamente
regressiva, atingindo muito mais a população mais pobre. Os
impostos indiretos (ICMS, IPI, COFINS, etc.) incidem sobre bens e
serviços e representam quase a metade do total dos impostos; são
regressivos, isto é, atinge proporcionalmente mais os pobres do que
os ricos; enquanto que os impostos diretos (IR, IPTU, ITR, ITBI,
etc.) incidem sobre a renda e o patrimônio representam apenas 26,63%
do total da carga tributária são considerados progressivos, ou
seja, atingem proporcionalmente pobres e ricos. Assim, segundo o
IPEA, no Brasil os pobres pagam mais impostos (48,9% de sua receita
pra quem ganha até 2 salários-mínimos) do que os ricos (que pagam
apenas 26,3% de sua receita em impostos, pra quem ganha acima de 30
SMs).
Outra questão de injustiça fiscal no Brasil é a
distribuição do bolo tributário: os municípios recebem menos do
que os governos centrais: 18% do total da receita nacional (arrecadam
5% em receita própria e recebem mais 13% em transferências
tributárias). Ou seja, mais de 2/3 das receitas municipais vêm de
transferências dos governos estaduais e federal. Nos países
desenvolvidos e mesmo em países latino-americanos (Chile, Colômbia,
Bolívia) os municípios arrecadam cerca de 30% do bolo fiscal.
Afinal, quem está mais próximo do cidadão é o município, daí a
necessidade de descentralização fiscal.
As transferências do governo federal – tais
como o FPM (Fundo de Participação dos Municípios – IPI e IR)
usam critérios distributivistas, ou seja, contribuem para melhorar a
distribuição de renda, pois o principal critério é população.
Os pequenos municípios, que possuem pouco comércio de mercadorias e
pouquíssima receita própria dependem quase que exclusivamente de
transferências federais.
A principal transferência dos governos estaduais
para os municípios é do ICMS (25% do que arrecadam voltam para a
origem). Os Estados poderiam usar critérios mais justos na
distribuição das cotas aos municípios, mas não usam e assim esta
transferência acaba sendo altamente concentracionista. Para tentar
corrigir estas distorções é que foi criada a Lei Robin Hood, que
entrou em vigor em Minas Gerais a partir de 1995. Esta lei melhorou
no início a situação dos pequenos municípios mineiros, mas no
ritmo que as coisas estavam indo nem em longo prazo as distorções
seriam corrigidas. Em Minas Gerais, os 150 municípios que mais
arrecadaram ICMS antes da lei, concentravam 91,94% do total deste
tributo em 1995. Em 1998, este percentual caiu para cerca de 79% do
total arrecadado. Em 2002 78,77 %. Em 2006, 78,83 %. Em 2010, 78,65%.
A mesma coisa entre os 12 maiores municípios arrecadadores: os 12
maiores arrecadaram 50 % do total no início da lei, 40,8% do total
em 2002, voltando a subir lentamente de 40,5 % do total em 2006;
40,7% (2008) e 41,35% em 2010. Enfim, percebemos que a lei provocou
mudanças significativas apenas no início e depois estabilizou, com
uma tendência à reconcentração. Assim, o governo reformulou
novamente a lei de 1995.
A lei Robin Hood anterior (13.803 de 2000),
distribuía os recursos com os seguintes critérios: VAF (79,68%), e
o restante critérios distributivistas (como área, população,
educação, cultura, meio ambiente, saúde, etc.). A nova lei (Lei
18.030 de 2009), que produz efeitos desde janeiro de 2011,
retira 4,68% do VAF, ficando assim a nova distribuição: VAF (75%),
critérios distributivistas 25% (mesmos critérios anteriores e seis
novos critérios, entre eles o maior: o ICMS Solidário = 4,14%).
Segundo o próprio governo, os municípios (176)
mais ricos sofreriam queda na receita do tributo em cerca de R$ 266
milhões (que seriam redistribuídos aos 80% municípios (677) mais
pobres). Realmente, estes municípios perderam R$ 314 milhões em
2011, se comparados com 2010. Em 2011, os maiores municípios
arrecadadores perderam participação no total do Estado: os 12
maiores: 39,69% (41,35% em 2010), e os 150 maiores: 77,07% (era
78,65% em 2010). Em junho de 2012, os 12 maiores tinham 39,40% do
ICMS total do Estado e os 150 maiores 77,14%. Ainda é pouco e continua altamente concentrado as receitas de ICMS nos maiores municípios, mas a nova lei fez uma diferença razoável para alguns dos pequenos municípios que souberam aproveitar melhor os novos critérios (veja tabela abaixo).
No Vale do Aço, 3 municípios perderam receita no
período 2011/2010, todos os outros ganharam, principalmente os
pequenos (vide tabelas abaixo).
Mas estas perdas tendem a se estabilizarem
a partir de 2011, mantendo-se os atuais critérios. Por exemplo, em
Ipatinga o primeiro semestre de 2012 foi 3,3% superior ao mesmo
semestre de 2011, embora tenha sido inferior ao segundo semestre de
2011 (houve tendência crescente da receita a partir de fevereiro
2012). Em Timóteo, por outras razões houve uma queda de 12,8% na
cota recebida de ICMS no período 2012/2011 (primeiro semestre). Já
as transferências federais foram mais positivas para a região:
Ipatinga recebeu 7,3% a mais no primeiro semestre de 2012 (em relação
ao mesmo semestre de 2011) e 4,95% a mais em relação ao último
semestre de 2011. Timóteo também arrecadou mais FPM (15,7% a mais
em relação ao mesmo semestre 2012/2011) e 13,2% a mais em relação
ao semestre anterior (2012/2011).
O terceiro município do Vale do Aço, Belo Oriente, em que houve redução do ICMS de 2011 em relação ao de 2010 (devido à nova lei), também se estabilizou a partir de 2011: recebeu 11% a mais no primeiro semestre de 2012, em relação ao primeiro semestre de 2011; embora a arrecadação tenha sido inferior em relação ao segundo semestre de 2011 (período atípico, devido ao décimo terceiro, férias, natal,etc.). As transferências federais também foram positivas: 7,5% a mais no primeiro semestre de 2012 em relação ao primeiro semestre de 2011; e 5% a mais no primeiro semestre de 2012 em relação ao último de 2011.
* Daniel Miranda
Soares é economista, EPPGG aposentado, ex-pesquisador da FJP e
mestre pela UFV.
Anexo 1: repasse ICMS segundo Lei Robin Hood |
LEI N° 18.030, DE 12 DE JANEIRO DE 2009 |
Nova Lei Robin Hood, em vigor a partir de janeiro de 2011 |
Critério: total do repasse de ICMS: VAF e outros critérios |
MUNICÍPIOS RMVA |
TOTAL 2010 |
TOTAL 2011 |
|
|
|
CORONEL FABRICIANO |
8.917.785,15 |
10.856.938,79 |
IPATINGA |
164.375.745,03 |
121.964.045,26 |
SANTANA DO PARAISO |
5.254.160,04 |
6.334.560,01 |
TIMOTEO |
56.479.060,92 |
42.634.345,29 |
|
|
|
Municípios Colar RMVA |
Total 2010 |
Total 2011 |
Açucena |
1.334.913,07 |
1.611.249,47 |
Antônio Dias |
4.168.000,97 |
4.560.365,49 |
Belo Oriente |
18.444.644,54 |
15.762.352,66 |
Braúnas |
2.252.209,73 |
2.416.363,63 |
Bugre |
752.299,59 |
921.022,21 |
Córrego Novo |
1.068.896,86 |
1.456.384,50 |
Dionísio |
1.677.256,87 |
1.901.321,29 |
Dom Cavati |
930.255,23 |
1.113.224,98 |
Entre Folhas |
935.907,03 |
984.096,35 |
Iapu |
1.497.198,07 |
1.684.594,07 |
Ipaba |
1.340.300,46 |
1.723.504,01 |
Jaguaraçu |
1.068.803,35 |
1.192.679,85 |
Joanésia |
1.630.826,07 |
1.689.904,56 |
Marliéria |
1.957.887,93 |
2.443.076,84 |
Mesquita |
1.013.929,85 |
1.184.631,53 |
Naque |
1.227.997,13 |
1.264.569,13 |
Periquito |
1.343.728,08 |
1.606.762,99 |
Pingo-d'Água |
1.086.674,76 |
1.252.668,93 |
São João do Oriente |
1.128.220,07 |
1.225.187,33 |
São José do Goiabal |
1.156.669,01 |
1.225.988,42 |
Sobrália |
770.564,83 |
905.224,91 |
Vargem Alegre |
1.234.417,95 |
1.358.323,47 |
Fonte: FJP/Seplag/MG |
|
|
Anexo 2: Repasses do governo federal. FPM (IPI, IR) |
FPM= Fundo de Participação dos Municípios |
Critério básico: população |
MUNICÍPIOS RMVA |
TOTAL 2010 |
TOTAL 2011 |
|
|
|
CORONEL FABRICIANO |
20409129,14 |
25082511,97 |
IPATINGA |
36423582,27 |
44371335,51 |
SANTANA DO PARAISO |
8928994,22 |
10973599,17 |
TIMOTEO |
16582417,55 |
20379541,06 |
|
|
|
Municípios Colar RMVA |
Total 2010 |
Total 2011 |
Açucena |
5102282,57 |
6270628,25 |
Antônio Dias |
3826711,99 |
4702971,28 |
Belo Oriente |
7653423,66 |
9405942,24 |
Braúnas |
3826711,99 |
4702971,28 |
Bugre |
3826711,99 |
4702971,28 |
Córrego Novo |
3826711,99 |
4702971,28 |
Dionísio |
5102282,57 |
4702971,28 |
Dom Cavati |
3826711,99 |
4702971,28 |
Entre Folhas |
3826711,99 |
4702971,28 |
Iapu |
5102282,57 |
6270628,25 |
Ipaba |
6377853,05 |
7838285,27 |
Jaguaraçu |
3826711,99 |
4702971,28 |
Joanésia |
3826711,99 |
4702971,28 |
Marliéria |
3826711,99 |
4702971,28 |
Mesquita |
3826711,99 |
4702971,28 |
Naque |
3826711,99 |
4702971,28 |
Periquito |
3826711,99 |
4702971,28 |
Pingo-d'Água |
3826711,99 |
4702971,28 |
São João do Oriente |
3826711,99 |
4702971,28 |
São José do Goiabal |
3826711,99 |
4702971,28 |
Sobrália |
3826711,99 |
4702971,28 |
Vargem Alegre |
3826711,99 |
4702971,28 |
Fonte: STN/Ministério da Fazenda |
|
|