DESMISTIFICANDO O CONCEITO DE SOCIALISMO.
Vamos começar a desmistificar o conceito de socialismo com a interessante definição do termo feita pelo escritor Antonio Cândido, em entrevista que concedeu ao Brasil de Fato .....Em seguida à entrevista vamos reproduzir um pequeno texto de Karl Marx, em que ele resume sua obra, na introdução à Crítica da Economia Política. Aqui podemos perceber a compatibilidade entre os dois autores.
Antonio
Candido de Mello e Souza nasceu
no Rio de Janeiro em 24 de julho de 1918, concluiu seus estudos
secundários em Poços de Caldas (MG) e ingressou na recém-fundada
Universidade de São Paulo em 1937, no curso de Ciências Sociais.
Defendeu
sua tese de doutorado, publicada depois como o livro “Os Parceiros
do Rio Bonito”, em 1954.
De
1958 a 1960 foi professor de literatura na Faculdade de Filosofia de
Assis. Em 1961, passou a dar aulas de teoria literária e literatura
comparada na USP, onde foi professor e orientou trabalhos até se
aposentar, em 1992. Na década de 1940, militou no Partido Socialista
Brasileiro, fazendo oposição à ditadura Vargas. Em 1980, foi um
dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Colaborou nos
jornais Folha
da Manhã e Diário
de São Paulo,
resenhando obras literárias.
Aos
93 anos, Antonio Candido explica a sua concepção de socialismo, nesta entrevista concedida ao site Brasil de Fato em 2011, entre outros assuntos..... “O que se pensa que é a
face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele”,
afirma.
Brasil
de Fato (08
de Agosto de 2011 edição
435): O
senhor é socialista?
Ah, claro, inteiramente. Aliás, eu acho que o socialismo é uma doutrina totalmente triunfante no mundo. E não é paradoxo. O que é o socialismo? É o irmão-gêmeo do capitalismo, nasceram juntos, na revolução industrial. É indescritível o que era a indústria no começo. Os operários ingleses dormiam debaixo da máquina e eram acordados de madrugada com o chicote do contramestre. Isso era a indústria. Aí começou a aparecer o socialismo. Chamo de socialismo todas as tendências que dizem que o homem tem que caminhar para a igualdade e ele é o criador de riquezas e não pode ser explorado. Comunismo, socialismo democrático, anarquismo, solidarismo, cristianismo social, cooperativismo... tudo isso. Esse pessoal começou a lutar, para o operário não ser mais chicoteado, depois para não trabalhar mais que doze horas, depois para não trabalhar mais que dez, oito; para a mulher grávida não ter que trabalhar, para os trabalhadores terem férias, para ter escola para as crianças. Coisas que hoje são banais. Conversando com um antigo aluno meu, que é um rapaz rico, industrial, ele disse: “o senhor não pode negar que o capitalismo tem uma face humana”. O capitalismo não tem face humana nenhuma. O capitalismo é baseado na mais-valia e no exército de reserva, como Marx definiu. É preciso ter sempre miseráveis para tirar o excesso que o capital precisar. E a mais-valia não tem limite. Marx diz na “Ideologia Alemã”: as necessidades humanas são cumulativas e irreversíveis. Quando você anda descalço, você anda descalço. Quando você descobre a sandália, não quer mais andar descalço. Quando descobre o sapato, não quer mais a sandália. Quando descobre a meia, quer sapato com meia e por aí não tem mais fim. E o capitalismo está baseado nisso. O que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue. Hoje é normal o operário trabalhar oito horas, ter férias... tudo é conquista do socialismo. O socialismo só não deu certo na Rússia.
Ah, claro, inteiramente. Aliás, eu acho que o socialismo é uma doutrina totalmente triunfante no mundo. E não é paradoxo. O que é o socialismo? É o irmão-gêmeo do capitalismo, nasceram juntos, na revolução industrial. É indescritível o que era a indústria no começo. Os operários ingleses dormiam debaixo da máquina e eram acordados de madrugada com o chicote do contramestre. Isso era a indústria. Aí começou a aparecer o socialismo. Chamo de socialismo todas as tendências que dizem que o homem tem que caminhar para a igualdade e ele é o criador de riquezas e não pode ser explorado. Comunismo, socialismo democrático, anarquismo, solidarismo, cristianismo social, cooperativismo... tudo isso. Esse pessoal começou a lutar, para o operário não ser mais chicoteado, depois para não trabalhar mais que doze horas, depois para não trabalhar mais que dez, oito; para a mulher grávida não ter que trabalhar, para os trabalhadores terem férias, para ter escola para as crianças. Coisas que hoje são banais. Conversando com um antigo aluno meu, que é um rapaz rico, industrial, ele disse: “o senhor não pode negar que o capitalismo tem uma face humana”. O capitalismo não tem face humana nenhuma. O capitalismo é baseado na mais-valia e no exército de reserva, como Marx definiu. É preciso ter sempre miseráveis para tirar o excesso que o capital precisar. E a mais-valia não tem limite. Marx diz na “Ideologia Alemã”: as necessidades humanas são cumulativas e irreversíveis. Quando você anda descalço, você anda descalço. Quando você descobre a sandália, não quer mais andar descalço. Quando descobre o sapato, não quer mais a sandália. Quando descobre a meia, quer sapato com meia e por aí não tem mais fim. E o capitalismo está baseado nisso. O que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue. Hoje é normal o operário trabalhar oito horas, ter férias... tudo é conquista do socialismo. O socialismo só não deu certo na Rússia.
Virou
capitalismo. A revolução russa serviu para formar o capitalismo. O
socialismo deu certo onde não foi ao poder. O socialismo hoje está
infiltrado em todo lugar.
Digo
que o socialismo é uma doutrina triunfante porque suas
reivindicações estão sendo cada vez mais adotadas. Não tenho
cabeça teórica, não sei como resolver essa questão: o socialismo
foi extraordinário para pensar a distribuição econômica, mas não
foi tão eficiente para efetivamente fazer a produção. O
capitalismo foi mais eficiente, porque tem o lucro. Quando se suprime
o lucro, a coisa fica mais complicada. É preciso conciliar a ambição
econômica – que o homem civilizado tem, assim como tem ambição
de sexo, de alimentação, tem ambição de possuir bens materiais –
com a igualdade. Quem pode resolver melhor essa equação é o
socialismo, disso não tenho a menor dúvida. Acho que o mundo marcha
para o socialismo. Não o socialismo acadêmico típico, a gente não
sabe o que vai ser… o que é o socialismo? É o máximo de
igualdade econômica.
O
socialismo é o cavalo de Troia dentro do capitalismo. Se você tira
os rótulos e vê as realidades, vê como o socialismo humanizou o
mundo. Em Cuba eu vi o socialismo mais próximo do socialismo. Cuba é
uma coisa formidável, o mais próximo da justiça social. Não a
Rússia, a China, o Camboja. No comunismo tem muito fanatismo,
enquanto o socialismo democrático é moderado, é humano. E não há
verdade final fora da moderação, isso Aristóteles já dizia, a
verdade está no meio. Quando eu era militante do PT – deixei de
ser militante em 2002, quando o Lula foi eleito –
era
da ala do Lula, da Articulação, mas só votava nos candidatos
da extrema esquerda, para cutucar o centro.
É
preciso ter esquerda e direita para formar a média. Estou convencido
disso: o socialismo é a grande visão do homem, que não foi ainda
superada, de tratar o homem realmente como ser humano.
O
socialismo está andando… não com o nome, mas aquilo que o
socialismo quer, a igualdade, está andando. Não aquela igualdade
que alguns socialistas e os anarquistas pregavam, igualdade absoluta
é impossível. Os homens são muito diferentes, há uma certa
justiça em remunerar mais aquele que serve mais à comunidade. Mas a
desigualdade tem que ser mínima, não máxima. Sou muito otimista.
(pausa).
O
Brasil é um país pobre, mas há uma certa tendência igualitária
no brasileiro – apesar da escravidão - e isso é bom. "
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TRECHO
DO “PREFÁCIO À CRÍTICA DA ECONOMIA POLÍTICA DE 1859” EM QUE
KARL MARX RESUME SEUS ESTUDOS.
Karl
Marx. Londres, 1859.
………..
A
conclusão geral a que cheguei e que, uma vez adquirida, serviu de
fio condutor aos meus estudos, pode formular-se resumidamente assim:
na
produção social da sua existência, os homens estabelecem relações
determinadas, necessárias, independentes da sua vontade, relações
de produção, que correspondem a um determinado grau de
desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. O conjunto
destas relações de produção constitui a estrutura económica da
sociedade, a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura
jurídica e política e a qual correspondem determinadas formas de
consciência social. O modo de produção da vida material condiciona
o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral.
Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu
ser social que, inversamente, determina a sua consciência. Em certo
estádio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da
sociedade entram em contradição com as relações de produção
existentes ou, o que é a sua expressão jurídica, com as relações
de propriedade no seio das quais se tinham movido até então. Estas
relações transformam-se de formas de desenvolvimento das forças
produtivas em seus entraves. Abre-se então uma época de revolução
social. Com a transformação da base económica, toda a imensa
superestrutura se transforma com maior ou menor rapidez. Ao
considerarmos estas transformações, é sempre preciso distinguir
entre a transformação material das condições económicas de
produção, susceptível de ser constatada de modo cientificamente
rigoroso, e as formas jurídicas, políticas, religiosas ou
filosóficas, numa palavra, ideológicas em que os homens tomam
consciência deste conflito e o dirigem até ao fim. Assim como não
se julga um indivíduo pelo que ele pensa de si próprio, também não
se pode julgar uma tal época de revolução pela consciência que
ela tem de si própria, é preciso, pelo contrário, explicar esta
consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito
entre as forças produtivas sociais e as relações de produção.
Uma formação social nunca declina antes que se tenha desenvolvido
todas as forças produtivas que ela é suficientemente ampla para
conter e nunca surgem novas relações de produção superiores antes
de as suas condições materiais de existência se terem gerado no
próprio seio da velha sociedade. É por isso que a humanidade nunca
se propõe senão tarefas que pode levar a cabo, já que, se virmos
bem as coisas, chegaremos sempre à conclusão de que a própria
tarefa só surge se as condições materiais da sua resolução já
existem ou estão, pelo menos, em vias de se formarem. Em traços
largos, os modos de produção asiático, clássico, feudal e burguês
moderno podem ser qualificados como épocas progressivas da formação
económica da sociedade. As relações de produção burguesas são a
última forma antagónica do processo social da produção,
antagónica, não no sentido de antagonismo individual, mas no de um
antagonismo nascido das condições de existência social dos
indivíduos; mas as forças produtivas que se desenvolvem no seio da
sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais
que resolverão este antagonismo. Com esta formação social,
termina, portanto, a pré-história da sociedade humana".
Prestem atenção, principalmente neste trecho....(Uma formação social nunca declina antes que se tenha desenvolvido todas as forças produtivas que ela é suficientemente ampla para conter e nunca surgem novas relações de produção superiores antes de as suas condições materiais de existência se terem gerado no próprio seio da velha sociedade. É por isso que a humanidade nunca se propõe senão tarefas que pode levar a cabo, já que, se virmos bem as coisas, chegaremos sempre à conclusão de que a própria tarefa só surge se as condições materiais da sua resolução já existem ou estão, pelo menos, em vias de se formarem).
Como podem ver, os dois textos são compatíveis. Marx deixou claro que o socialismo só será gerado dentro do seio da velha sociedade, onde existe as condições materiais necessárias à sua existência. O socialismo só virá para resolver as contradições internas inerentes dentro do capitalismo e estas contradições só serão superadas por uma síntese - que é o resultado da luta de classes entre capital e trabalho. O capitalismo é o último modo de produção mais avançado da humanidade e ele está gerando dentro dele mesmo as condições para sua superação em um modo de produção superior à ele que é o SOCIALISMO....O socialismo só surgirá como modo de produção superior ao capitalismo e para tanto ele precisa resolver os conflitos, os problemas e as contradições geradas no seio do capitalismo.... Como disse Antônio Cândido, o socialismo nasceu junto com o capitalismo na revolução industrial e ele representa a face humana do capitalismo. Na luta pela igualdade, o socialismo vai conseguindo vitórias dentro do próprio capitalismo, humanizando sua face, melhorando o bem estar da população e suas condições de vida....e assim vai evoluindo, os dois juntos... pois o capital, como Marx dizia, tem seu lado positivo também que é o desenvolvimento das fôrças produtivas, o desenvolvimento de novas tecnologias... mas nós queremos novas tecnologias para todo mundo....e novas tecnologias que sejam benéficas à saúde da população e ao meio ambiente também......novas tecnologias que sejam mais baratas e que permite o acesso à toda população....e que o custo seja cada vez menor..... até chegar ao ponto de se produzir quase a custo zero, com tecnologias super avançadas......neste ponto bem mais avançado estaremos perto de chegar ao SOCIALISMO, pois as mercadorias serão tão acessíveis que provavelmente não terão preço ....e provavelmente não precisaremos de dinheiro....nem estimularemos a ganância e nem o lucro....pois todos estarão satisfeitos e não haverá necessidade de dinheiro nem de lucro, nem de ganância.... a luta pela igualdade representa a luta pela democracia cada vez mais profunda de modo a beneficiar toda a população....e esta luta vai precisar de grandes avanços na ciência e na tecnologia para se conseguir superar a escassez de mercadorias....e assim as mercadorias deixariam de existir como mercadoria ... e todo mundo teria acesso a tudo......A CADA UM DE ACORDO COM AS SUAS NECESSIDADES E A CADA UM DE ACORDO COM A SUA CAPACIDADE.... esse é o ápice do SOCIALISMO.....a democracia plena que atinge todos os cidadãos é o próprio socialismo....Se um dia conseguirmos chegar neste ponto da democracia plena, chegaremos no socialismo e até lá conseguiremos superar o capitalismo como modo de produção.
Daniel Miranda Soares é economista, ex-professor universitário e mestre pela UFV.
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