quinta-feira, 21 de julho de 2011

Sistema Financeiro manda no Banco Central


Variáveis inflacionárias controlaram-se, menos previsão do 'mercado'

Para o coordenador do Grupo de Análises e Previsões do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Roberto Messenberg, atividade econômica, mercado de trabalho, crédito e preço de commodities estão sob controle, deram trégua à inflação e não justificam mais aumento de juros pelo Banco Central. Só há um elemento fora de controle, as expectativas do 'mercado', que tem produzido avaliações descoladas do mundo real para manter o juro alto. "Talvez seja hora de o BC jogar mais duro", disse Messenberg.

André Barrocal
BRASÍLIA – A atividade econômica está menos veloz, o mercado de trabalho segue aquecido mas em ritmo moderado, o avanço do crédito desacelerou, o preço dos alimentos e dos combustíveis parou de subir. Não por acaso, os últimos índices de inflação mostram perda de força. Por tudo isso, o Banco Central (BC) não tem motivo para elevar a taxa de juros na noite desta quarta-feira (20/07). Só um elemento justificaria o conservadorismo. A visão do “mercado”, que ignora dados reais e mantém expectativas de inflação mais pessimistas.

A avaliação é do economista Roberto Messenberg, coordenador do Grupo de Análises e Previsões do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ele é responsável por um boletim trimestral do Ipea que analisa a conjuntura econômica cuja edição mais recente foi divulgada nesta quarta-feira, poucas horas antes da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC.

“Do ponto de vista das variáveis reais, não há motivo para aumentar a taxa de juros”, afirmou Messenberg. “Só há um senão: o Banco Central não opera de forma completamente isolada do mercado financeiro, que consegue exercer força e pressão com suas expectativas. Esta é a única variável que não foi controlada ainda.”

O “mercado” a que se refere o economista se expressa toda semana por meio de uma pesquisa feita pelo BC sobre juros e inflação com cerca de 100 instituições, a maioria ligada ao sistema financeiro. O levantamento divulgado segunda-feira (18/07) mostra que o “mercado” continua mantendo para o ano que vem uma previsão de inflação superior à meta que o BC diz perseguir.

O debate sobre a inflação de 2012 tornou-se importante desde que o BC avisou que não trabalharia para atingir a meta de 4,5% em 2011, mas só em 2012. Depois dessa decisão, o “mercado”, que antes projetava uma inflação até 4,5% no ano que vem, passou a prever mais – a última estimativa é de 5,2%.

Para Messenberg, a inflação sob controle em 2011 mostra que o Banco Central acertou todos os diagnósticos feitos este ano sobre o controle da inflação, construiu credibilidade com isso e, agora, deveria “ir contra o mercado financeiro”. “Talvez seja hora de o Banco Central jogar mais duro. Poderia ter uma estratégia de mostrar mais auto-confiança. O BC acertou tudo até agora”, afirmou.

Segundo o economista, o mercado continua enfrentando o BC e produzindo prognósticos diferentes por vício e interesse. “O mercado se acostumou a uma administração de política monetária que está completamente obsoleta no mundo inteiro. A realidade mudou, o mundo se complicou, não existe mais só o instrumento da taxa de juros contra a inflação”, disse. “Mas quando a taxa se eleva, o mercado ganha dinheiro e quem sofre são outros atores.”


BC admite que seria melhor mudar perfil de pesquisa de 'mercado'

Presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, reconhece no Senado que há peso excessivo do sistema financeiro na pesquisa semanal do BC com o "mercado" sobre inflação. Para ele, seria "melhor" que houvesse mais "diversidade" de entrevistados, mas mudança não dependeria só do banco. Levantamento, conhecido como Focus e dominado pelas finanças, influencia decisões do BC sobre taxas de juros. "Pessimismo" maior hoje não é dos bancos, mas de fundos administradores de dinheiro alheio.

André Barrocal
BRASÍLIA – O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, admitiu nesta terça-feira (05/07) que seria “melhor” mudar o perfil da pesquisa semanal do BC sobre inflação e juros feita com entidades tidas como representativas do “mercado”. O levantamento, conhecido como Focus, é dominado pelo sistema financeiro e tem grande poder de influenciar as decisões do BC sobre juros. “Mais diversidade seria melhor”, disse Tombini, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.

Na pesquisa Focus, o BC entrevista de 90 a 100 instituições uma vez por semana. Dois terços pertencem ao sistema financeiro. São bancos e fundos administradores de dinheiro alheio. A economia real – entidades industriais ou comerciais, por exemplo – responde pelo outro terço. O resultado é divulgado toda segunda-feira, na internet.

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), representantes da “economia real”, estão unidas na crítica à pesquisa e na defesa de uma reformulação dela.


CUT e Fiesp querem fim do poder de pesquisa de 'mercado'; BC nega

Com poder de influenciar decisões do Banco Central sobre taxa de juros, pesquisa semanal com 'mercado' é alvo de críticas de trabalhadores e de empresários do setor real da economia, que pedem mudanças. BC diz que levantamento é importante, não muda e que qualquer um pode aderir. Em dez anos, entrevistados já acertaram 75% das apostas sobre juros.

André Barrocal
BRASÍLIA – O Banco Central (BC) consulta toda semana de 90 a 100 instituições sobre as expectativas delas para inflação, crescimento econômico e taxas de juros, entre outros assuntos. É uma pesquisa que dá poder aos entrevistados. Suas respostas influenciam decisões do BC como, por exemplo, juros. Por isso, trabalhadores e empresários defendem mudanças no levantamento. Mas o BC discorda e diz que o modelo atual é importante e segue padrão internacional.

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, afirma que ninguém é mais “mercado” - em tese, o setor de cuja opinião o Banco Central está atrás nas pesquisas semanais – do que a entidade sindical dele. “Eu tenho sete milhões de trabalhadores na CUT, como é que eu não sou mercado?”, questiona Artur, que gostaria de ter seu ponto de vista levado em conta pelo BC.

Além de pedir modificações no levantamento, conhecido como Focus, a CUT reivindica também um novo modelo para o Conselho Monetário Nacional (CMN). Formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC, o Conselho define, por exemplo, a meta de inflação que o banco persegue. É uma reivindicação que vem desde o governo Lula, sem sucesso.

O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, é outro que condena o formato e o poder da pesquisa. “Há muito tempo que o mercado montou uma rede de proteção social que só defende o valor da moeda”, afirma Skaf. “É preciso acabar com essa ditadura do Focus.”

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