Artigo publicado no Jornal Diário do Aço (impresso dia 28).
27/08/2014 - 15h32 - Diário do Aço
http://www.diariodoaco.com.br/noticia/84421-7/opiniao/a-midia-matou-getulio-vargas
Na madrugada de 5 de agosto, o
major-aviador Rubens Vaz foi assassinado na rua Toneleros, no Rio, em
frente ao prédio onde morava Carlos Lacerda. Vaz era guarda-costas de um
dos maiores adversários do então Presidente Getúlio Vargas, o
jornalista Carlos Lacerda. Dezenove
dias após o crime da Toneleros, Lacerda e a direita nativa conseguiram
seu intento: Vargas deixou o Catete, porém, morto. O próprio Lacerda
narrou o episódio de diferentes maneiras, ajudando a tornar a história
ainda mais nebulosa.
Houve relatos de que ele deu um tiro no
próprio pé para criar uma encenação. Com o estouro desse escândalo,
criou-se um cenário favorável à deflagração de um golpe arquitetado por
conservadores e militares. “...o suicídio traz uma certeza
incontestável. Ele representou, se não a única, pelo menos a mais
poderosa arma de Vargas contra aqueles que o haviam cercado e queriam
sua cabeça. Com o suicídio, a oposição teve que esconder-se para não
apanhar do povo nas ruas. Vargas se colocava como vítima de um crime
contra o País.” (Antonio Lassance).
O que aconteceu de fato: Vargas foi
eleito democraticamente em 1950 com ampla vantagem popular. O seu
governo foi perseguido desde o início. Lacerda já dizia : “O
senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à Presidência.
Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado,
devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar”. Porque
Vargas era tão odiado pela mídia e pela direita conservadora (UDN,
etc.)? Por que queriam apeá-lo do poder de qualquer jeito? A verdade é
que Getúlio venceu nas urnas em 1950 por causa do que ele fez para o
trabalhador (CLT) e até hoje é lembrado por esse legado.
As leis trabalhistas já incluíam:
carteira assinada, previdência e aposentadoria, férias, 13º salário,
Salário Mínimo, Justiça do Trabalho; além do voto feminino, o sufrágio
universal, ensino primário obrigatório; o papel do Estado como principal
investidor na economia e o início da industrialização brasileira
(criando grandes estatais). Ele era tão querido pela população que o
seu suicídio provocou uma enorme manifestação popular, nunca se viu
tanta gente nas ruas do Rio de Janeiro, milhões de pessoas carregaram
seu corpo do Palácio do Catete até o aeroporto Santos Dumont.
Esta manifestação (e as fotos dela), uma
das maiores da história brasileira sempre foi abafada pela mídia,
preocupada em desconstruir a imagem da popularidade de Vargas. A
multidão também avançou contra os inimigos de Vargas : “A Tribuna da
Imprensa de Lacerda foi empastelada. A redação de O Globo foi atacada,
carros do jornal foram destruídos, o Jornal do Commercio teve sua
oficina invadida, vários dos 17 jornais foram alvos da massa" (Jânio de Freitas, do jornal “Diário Carioca”).
“A conspiração contra Vargas sempre
foi permanente, seja pelos agentes dos trustes estrangeiros, seja pelas
oligarquias nacionais. Mas, quando Vargas assinou o decreto para
controlar a remessa de lucros ao exterior, a situação se tornou
intolerável” (Samuel Pinheiro Guimarães).
O nacionalismo de Vargas criou fortes inimigos, tanto externos (o
governo dos EUA) quanto internamente (a elite oligarca brasileira).
Vargas foi tratado como criminoso, chefe
de quadrilha, e responsável por um mar de lama. A mídia sempre usou a
pecha da corrupção para derrubar seus adversários: “para derrubar um
presidente, basta uma forte suspeita, uma firme disposição da oposição
em fabricar acusações e um enredo incriminatório vendido como notícia” (Antonio Lassance). Podem-se ver muitas semelhanças com o governo Lula, mas hoje existe mais alternativas à mídia corporativa (como a internet).
Segundo Augusto Nunes,
a mídia, apesar de seu poder manipulador, não conseguiu evitar as
eleições de líderes populares em pelo menos três situações: Vargas
(1950), Brizola (1982) e Lula (2002). Lula deixou o governo depois de
dois mandatos com aceitação recorde (87% de aprovação popular) por causa
de seus programas sociais e a valorização do Salário Mínimo e Brizola
não fez tanto sucesso por conta da campanha difamatória movida contra
ele pela rede Globo. “A verdade é que a imprensa pode muito e não pode nada ao mesmo tempo porque é movida pelo dinheiro” (Augusto Nunes).
Quando
colocamos em confronto o capital e o trabalho, a grande imprensa fica
com a primeira opção e o povo com a segunda. Quando o trabalhador é
favorecido por decisões políticas em governos trabalhistas, a imprensa
fica com o capital. A popularidade de Lula aumentou apesar da extrema
hostilidade que ele sofreu por parte da mídia. Em 2010, Maria Judith Brito, presidente da Associação Nacional dos Jornais disse :“Obviamente,
esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição
oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente
fragilizada.”
A perseguição continuou no governo
Dilma. Segundo o Manchetômetro (pesquisa do laboratório de Mídia da
UERJ), as manchetes dos grandes jornais nacionais revela que entre
janeiro e julho de 2014, Dilma Rousseff (PT) foi bombardeada com 182
manchetes negativas nos respectivos jornais, contra 18 manchetes para
Aécio Neves (PSDB) e 15 para Eduardo Campos (PSB). Enquanto o Jornal
Nacional (Rede Globo) dedicou 1 hora e 22 minutos em 2014 para notícias
consideradas desfavoráveis para a petista, contra apenas três minutos
para reportagens consideradas favoráveis.
Para Venício Lima (A Ilusão do Quarto Poder, em Teoria&Debate) a mídia se transformou em megagrupos corporativos à altura das grandes corporações, monopolizando em meia dúzia de famílias grande poder econômico e político, controlando o que vemos, ouvimos e lemos, praticamente todo o fluxo da informação. Portanto o Quarto Poder independente (a mídia) não existe mais, pois ela mesma defende os mesmos interesses das grandes corporações. Noam Chomsky já disse:“o propósito da mídia não é de informar o que acontece, mas sim de moldar a opinião pública de acordo com a vontade do poder corporativo dominante.” E o poder corporativo dominante hoje é o capital financeiro que propaga o neoliberalismo - daí a perseguição da mídia aos governos trabalhistas que não aceitam os dogmas neoliberais.
*Daniel Miranda Soares, economista Msc.
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