Por Douglas Belchior
Em
seu texto sobre a polêmica dos médicos cubanos no Brasil e a reação de
uma jornalista potiguar que escandalizou as redes sociais ao dizer que
médicos cubanos pareciam “empregadas domésticas”, e que precisariam ter “postura de médico”, o que não acontecia com os profissionais cubanos, o professor Dennis de Oliveira sintetizou:
“(…)
ela expressou claramente o que pensa parte significativa dos segmentos
sociais dominantes e médios do Brasil: para eles, negros e negras são
tolerados desde que em serviços subalternos. Esta é a “tolerância”
racial brasileira.”
Essa
mentalidade racista que sempre pressupôs o lugar do negro em nossa
sociedade, contaminou milhares de jovens estudantes nas últimas muitas
gerações. Isso somado ao descaso com a qualidade da educação pública faz
com que, em sua grande maioria, jovens negros e/ou pobres sequer sonhem
com universidades ou profissões “diferentes” daquelas nas quais
percebem seus iguais.
HERDEIROS DE NINA RODRIGUES
A
classe médica (e média) que hoje não se constrange em manifestar seu
preconceito racial é herdeira de Nina Rodrigues. Racista confesso, o
renomado médico baiano tentava dar cientificidade à sua tese sobre as
raças inferiores. Acreditava ele que os negros tinham capacidade mental
limitada e uma tendência natural à criminalidade.
No
final do século XIX, Nina Rodrigues combatia a miscigenação por
acreditar que qualquer mistura poderia degenerar a raça superior branca.
Mais ainda, defendia a existência de dois códigos penais: uma para os
brancos e outro para as raças inferiores. Esses e outros absurdos podem
ser observados em seu livro “As Raças Humanas e a Responsabilidade Penal
no Brasil’.
A população negra perfaz mais de 50% da população brasileira, mas entre os formados em medicina o percentual foi de 2,66% em 2010.
Na USP, por exemplo, são comuns listas de aprovados nos vestibulares
mais concorridos sem sequer um único auto-declarado negro, como foi o caso deste ano de 2013. Isso se repete na Bahia,
onde mais 70% da população é negra. Simbólica e triste a foto ao
lado, que traz a turma de 2011 da Universidade Federal da Bahia. (OBS: eu contei 3 negros).
A DECLARAÇÃO DE CÍNTIA, DO CAPÃO
Cintia Santos Cunha foi
uma exceção. E ao a ouvi-la falar, ao perceber a postura de dignidade
que todo ser humano pode – se quiser, carregar, independente de sua
profissão, é possível entender o porquê de tanta oposição por parte das
classes dominantes em relação à presença dos doutores de pele preta: a
descoberta de sua mediocridade.
Médicos,
imprensa e Conselho Federal de Medicina corporativistas, reacionários,
cínicos e racistas, é para vocês a grande lição deixada pela estudante
de medicina em CUBA, Cíntia Santos Cunha, que retornou a Ilha para
concluir o curso em Fevereiro de 2014.
É do povo que vocês tem medo! E devem mesmo ter medo! Toda sua riqueza não é suficiente para compensar os mais de 500 anos de opressão.
Assistam e assustem-se!
http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=905669063311d8a17bd6958cd353eedd&cod=12364
“Eu
já desde muito nova queria fazer Medicina… só que Medicina é um curso
impensável para as pessoas de onde eu venho, para as pessoas como eu
sou, negra, mulher, pobre, Capão Redondo. Ninguém sonha ser médico lá.
Eu insisti que queria fazer medicina.” – Cintia Santos Cunha
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